Marcel Frajblat possui graduação em Medicina Veterinária pela Universidade Federal Fluminense (UFF), mestrado e doutorado em Fisiologia da Reprodução pela Cornell University e pós-doutorado em biotecnologia da reprodução pela Cornell University. Foi Presidente da Sociedade Brasileira de Ciência em Animais de Laboratório (SBCAL) e representante do CNPq no Conselho Nacional de Controle da Experimentação Animal (CONCEA). É professor do Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Atua nas áreas de produção e criopreservação de gametas e embriões de roedores e fisiologia da reprodução e em produção e bem-estar de animais de laboratório. É membro da Diretoria da FeSBE e membro da Rede de Biotérios do CNPq. Foi responsável pela criação da Coordenação de Atividades com Modelos Biológicos Experimentais (CAMBE) da UFRJ onde coordena a Comissão de Ética no Uso de Animais do CCS, a Comissão Veterinária e o Laboratório de Ciência Animal.
Foi entrevistado para o SBBNews pela Prof. Liliane de Freitas Bauermann, membro titular e coordenadora científica de Radiobiologia da SBBN.
Liliane Bauermann possui mestrado e doutorado em Ciências Biológicas (Fisiologia) pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. É professora associada do Departamento de Fisiologia e Farmacologia da Universidade Federal de Santa Maria, orientadora dos cursos de Pós-graduação em Ciências Farmacêuticas e em Farmacologia.
SBBNews: Neste ano foram realizados simpósios com a temática “Reprodutibilidade em Ciências Biomédicas” (RJ e SP). Quais os motivos que levaram à realização destes simpósios?
Prof. Marcel: Todas as áreas da ciência estão em constante evolução. O processo científico deve fazer parte desta evolução e nos últimos anos diversos artigos internacionais têm detectado a dificuldade de reproduzir experimentos publicados. Esta reprodutibilidade é uma das características principais da ciência. O problema da irreprodutibilidade foi identificado e, neste momento, a discussão é quais as melhores estratégias para resolver este problema. A FeSBE reconhece a importância deste assunto e decidiu trazer esta discussão para a comunidade científica que trabalha com pesquisa biomédica.
SBBNews: Do seu ponto de vista, como foi a receptibilidade deste evento? Qual público atingido?
Prof. Marcel: Foi muito bom. Houve uma procura grande e todos que participaram nos indicaram que as evidências do problema são impressionantes e que realmente precisamos identificar suas causas e procurar e experimentar soluções.
SBBNews: No momento atual da situação da pesquisa em nosso país, quais as perspectivas para as pesquisas “in vitro” e “in vivo”?
Prof. Marcel: O momento atual está ruim para qualquer área da pesquisa. A pesquisa “in vivo” é cara e complexa. O animal é um ser senciente e o número de fatores que pode interferir no resultado de um experimento é alto e por isso necessita ser controlado. Para evitar estas interferências, os animais precisam ser produzidos em biotérios bem estruturados e mantidos em biotérios de experimentação também em condições adequadas. Já nos experimentos “in vitro”, temos menos fatores que podem interferir, porém temos também limitações quanto ao tipo de resposta comparada a um organismo completo.
SBBNews: A procura por respeitar os 3Rs, como a diminuição no número uso dos animais na pesquisa, como pode isto ser refletido na reprodutibilidade dos resultados da mesma?
Prof. Marcel: O R da redução do número de animais deve ser utilizado com cautela. Uma das diversas causas identificadas como possíveis causadores de problemas com reprodutibilidade é a não realização de cálculos do número de animais necessário para o estudo. Sem a realização deste cálculo e na tentativa de reduzir o número de animais utilizados, muitos experimentos estão sendo realizados com um número menor que o necessário o que dificulta a análise estatística. O cálculo amostral deve ser realizado em todos projetos de pesquisa com animais, mesmo que tenhamos como consequência um aumento do número de animais utilizados.
SBBNews: Há preocupação com a qualidade dos instrumentos/equipamentos e/ou insumos para a aceitação dos resultados das pesquisas?
Prof. Marcel: Sim. A Ciência em Animais de Laboratório tem como objetivo estudar a produção e uso cientifico de animais e como os muitos fatores envolvidos podem interferir nos resultados. Por exemplo, um animal que está em equipamento de manutenção como um rack individualmente ventilado estará exposto a níveis de amônia bem menores que aqueles em caixas abertas. Essa diferença pode interferir nos resultados. A composição da ração, da cama, água entre diversos outros fatores podem influenciar os resultados e necessitam ser controlados. Os resultados são normalmente aceitos e publicados, mas estas variações dificultam sua reprodutibilidade.
SBBNews: Para validar uma pesquisa é suficiente garantir que o tamanho da amostra é adequado?
De acordo com as discussões sobre reprodutibilidade, a validação dos resultados é obtida quando estes são reproduzidos por outros pesquisadores em outros laboratórios. A publicação de um artigo é uma etapa importante do processo científico, mas a revisão por pares tem se mostrado pouco eficiente na detecção de problemas que interferem na sua reprodutibilidade. Desta forma, a reprodução de um resultado por terceiros pode ser considerada sua validação.
O Prof. Marcel proferirá a palestra “A crise da reprodutibilidade de resultados científicos e soluções-Proposta do protocolo ARRIVE e software desenvolvido pelo NC3R” no dia 9 de outubro, durante a Mesa redonda 1: Modelos experimentais e desafios na área biomédica, no XII Congresso da SBBN.